sábado, 4 de junho de 2011

Biblioteca João Pereira Coutinho

A BUSCA DA VERDADE
‘Nobreza de Espírito: Um Ideal Esquecido’ o livro do filósofo holandês Rob Riemen explica que para mudar o mundo teremos de começar por nós.
Por: João Pereira Coutinho

A Editorial Bizâncio está de parabéns: é preciso sabedoria e coragem para publicar este ‘Nobreza de Espírito: Um Ideal Esquecido’, tratado filosófico que Rob Riemen escreveu em 2008. Mas sabedoria e coragem fazem parte da nobreza de que fala o título. Os editores da Bizâncio estão no caminho certo.
E nós? Nós, infelizmente, vivemos ainda na ressaca de dois extremos. Quando falamos em ‘nobreza’, os partidários do primeiro extremo abraçam-se à nobreza de berço, ou de sangue, que nobilita o indivíduo pela força dos genes. ‘Nobre’ é nascer nobre, uma classificação que foi perdendo sentido e lugar na era igualitária em que vivemos e que Tocqueville já profetizara na sua célebre viagem pela América.
No extremo oposto, encontramos uma outra forma de nobreza: a nobreza do vil metal, para a qual a dimensão de um homem funde-se e confunde-se com o tamanho da sua conta bancária. Eis uma versão caricatural do ‘self-made man’, para o qual a sorte ou a mera imperfeição humana não têm qualquer valor. Somos o que conseguimos acumular.
A ‘nobreza’ de que fala Rob Riemen é de outro tipo; é a nobreza dos que procuram a Verdade, a Beleza e o Bem, para repetir a vetusta trilogia que os Gregos nos legaram. É a busca desse ‘ideal de vida esquecido’ que moveu pensadores tão distintos como Espinosa, Thomas Mann e Leone Ginzburg, morto pelos nazis na Itália ocupada.

EDUCAÇÃO LIBERAL
Mas como se adquire essa ‘nobreza de espírito’? Se a pergunta fosse formulada a Aristóteles, a resposta do mestre seria: pelo hábito. Não apenas pela necessidade de cultivar as virtudes que consideramos necessárias para o florescimento humano – a coragem, a moderação, a sabedoria, a justiça – mas pelo contacto permanente com os grandes nomes da cultura. Só pela ‘educação liberal’ é possível elevar a nossa básica humanidade.
É esse convívio com os fantasmas de uma civilização que nos permite cultivar a liberdade interior, sem a qual não existe verdadeira liberdade em sentido político. Só como homens livres podemos habitar uma Cidade livre.
Trata-se de um exercício difícil, solitário, por vezes exasperante. Mas é um exercício necessário para não sucumbir às modas do momento. Quando não acreditamos em nada, advertia Chesterton, estamos maduros para acreditar em qualquer coisa. E muitos dos melhores intelectos do séc. XX, lembrados por Riemen, sucumbiram a essa armadilha intelectual; sucumbiram, no fundo, a essas "religiões seculares", como lhes chamava Raymond Aron, que mais não eram do que versões bastardas da fé tradicional em declínio.
"Não basta interpretar o mundo, é necessário transformá-lo", afirmava Karl Marx. Rob Riemen revisita o mandamento e, com a sua ‘Nobreza de Espírito’, reformula-o: "Não basta interpretar o mundo, nem sequer transformá-lo; antes de começarmos pelo mundo, devemos começar por nós".
RESUMO
Ensaio do filósofo Rob Rimen sobre o ideal da "nobreza de espírito"
Título original: ‘Adel van de Geest’
Autor: Rob Riemen
Editora: Bizâncio
Tradução: António Carvalho

(in Correio da Manhã)

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