terça-feira, 23 de junho de 2009
D. NUNO ALVARES PEREIRA por Pinheiro Chagas
É o mais brioso paladino da nossa historia, e um dos mais notáveis guerreiros de Portugal. Foi, bem o podemos dizer, o Achilies portuguez, porque foi como Achilles invencível. Nasceu a 24 de Junho de 1360 no Bomjardim, junto da villa da Certa segundo as melhores opiniões; era filho do prior do Grato D. Álvaro Pereira, que na batalha do Salatlo muito se distinguira. Enthusiasta, desde creança, pêlos romances de cavallaria, folgando de imitar os heroes d'esses livros, sempre valentes como as armas e leaes como as suas espadas, distinguiu-se já nas guerras de D. Fernando contra Castella; mas a sua brilhante carreira começa verdadeiramente, quando, em 1383, tomando o partido do Mestre d’Aviz, o eleito do povo, a quem consagra desde então affecto inabalável, se mostra o mais firme esteio do seu throno, e da independência da pátria. É o terror dos castelhanos; o seu valor, e ao mesmo tempo o seu instincto militar, sempre lhe asseguram a victoria; derrota-os em Atoleiros no Alemtejo em 1384; voa a Coimbra a sustentar nas cortes a causa do Mestre d'Aviz; aconselha-o, quasi que o obriga, a dar a batalha d'Aljubarrota; contribúe mais do que ninguém para essa gloriosa victoria; entra depois em Castella com cinco ou seis mil homens; destroça em Valverde junto do Guadiana trinta e trez mil castelhanos; em todas as invasões, em todos os recontros, é sempre o primeiro na vanguarda. Quando a guerra da independência termina, e a expedição de Ceuta se resolve, lá vae ainda entre os expedicionários o velho condestavel! O seu rei e seu amigo fel-o conde de Barcellos, conde d’ Ourem, conde d'Ar-rayolos, condestavel do reino, mordomo-mór do paço; assim recompensado e poderoso, larga tudo para ir viver vida modesta e obscura, no silencio do claustro, recolhendo-se ao convento do Carmo, que fundara em Lisboa, e onde morreu a l de Novembro de 1431.
Sua filha D. Isabel casou com D. Affonso, filho bastardo de D. João i; e d'esse matrimonio proveio a casa de Bragança, que hoje occupa o soiio de Portugal.
Valente, ninguém o foi mais; de lealdade, era um modelo; austero nos costumes, religioso, a todos dava o exemplo da piedade e da moralidade. Desabrido ás vezes com o seu rei, que lhe tolerava tudo, cheio de preconceitos da velha nobresa, resistindo por conseguinte ás tentativas de D. João I para aplanar, emvolta do solio, esse terreno desegual, formado pelas classes privilegiadas, esquecia todos os dissentimentos, quando o seu companheiro d'armas, o seu amigo lhe estendia os braços. Aquelle espirito enthusiaste e eternamente juvenil, aquelle coração d'oiro, conservavam, sempre vívida, como em sacrário íntimo, a chamma da amisade fraternal, que unira desde tenros annos os dois heroes d'Aljubarrota.
Era verdadeiramente uma figura épica a do Condestavel, mas tinha no carater a bondosa mansidão dos fortes. Se a sua physionomia, na agitação das batalhas, lembra as figuras da Ilíada, na meia luz da intimidade, traz-nos á memoria aquelles vultos que Homero, na Odysséa, tão docemente agrupa emtorno dos velhos lares da Grécia.
M. Pinheiro Chagas, Portuguezes Illustres, Lisboa, 1873, págs. 18-20
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